Receber um laudo com “alteração” no Papanicolau assusta, mas, na maioria dos casos, não é motivo para pânico. Esses achados costumam refletir alterações leves nas células do colo do útero, muitas vezes relacionadas ao HPV, inflamações ou processos transitórios que tendem a regredir sozinhos — especialmente em pessoas jovens.
Em linhas gerais: ASC-US e LSIL não significam câncer. São sinais de alterações leves que pedem acompanhamento estruturado para manter tudo sob controle.
Antes de tudo: o que o Papanicolau avalia
- É um exame citológico: observa-se, ao microscópio, o “aspecto” das células colhidas do colo do útero.
- Diferente de biópsia (histologia), que avalia tecido. A biópsia só é indicada quando o risco justifica, geralmente após colposcopia.
Entendendo os termos do laudo
ASC-US (Atypical Squamous Cells of Undetermined Significance)
- O que é: atipias escamosas de significado indeterminado. São mudanças muito leves nas células que não permitem concluir se é apenas inflamação/irritação ou efeito do HPV.
- Causas comuns: inflamações cervicais, vaginites, uso recente de duchas/cremes, relação sexual nas 24–48 horas anteriores à coleta, e infecção por HPV.
- Prognóstico: na maioria dos casos, regride espontaneamente.
LSIL (Low-grade Squamous Intraepithelial Lesion)
- O que é: lesão intraepitelial escamosa de baixo grau, geralmente associada à infecção por HPV de baixo risco ou a infecção inicial por HPV de alto risco.
- Significado: baixo potencial de progressão; tendência à regressão em 1–2 anos, especialmente em pessoas jovens.
- Objetivo do seguimento: confirmar que não há lesão de alto grau “escondida” e acompanhar até a regressão.
O que NÃO significa
- Não é diagnóstico de câncer.
- Não implica necessariamente tratamento imediato.
- Não significa que você “pegou” HPV recentemente; muitas infecções são antigas e latentes.
Próximos passos: como é o acompanhamento
Os passos podem variar de acordo com:
- Idade
- Disponibilidade do teste de HPV (coletado junto ou como “reflexo” após o resultado)
- História prévia (exames anteriores, tratamentos)
- Situações especiais (gravidez, imunossupressão)
Abaixo, um roteiro prático e seguro para conversar com sua ginecologista.
1) Verifique se seu laudo menciona teste de HPV
- Se houver “HPV de alto risco: negativo”: o risco imediato é baixo.
- Se “HPV de alto risco: positivo” (especialmente genótipos 16/18): o risco é maior e costuma indicar colposcopia.
2) Fluxo geral por achado
Quando o achado é ASC-US
- Com teste de HPV:
- HPV negativo: retornar ao rastreio de rotina (sua médica pode recomendar novo exame em 3 anos, a depender do protocolo local).
- HPV positivo: geralmente indica colposcopia para avaliar melhor.
- Sem teste de HPV:
- Repetir a citologia em 6–12 meses (o intervalo exato pode variar por idade e protocolo local).
- Se persistir a alteração ou piorar (ex.: evoluir para HSIL), indicar colposcopia.
Quando o achado é LSIL
- Com teste de HPV:
- HPV positivo (qualquer alto risco): costuma indicar colposcopia.
- HPV negativo: risco baixo; repetir em 12 meses é uma conduta comum.
- Sem teste de HPV:
- Repetir citologia em 6–12 meses ou indicar colposcopia, conforme idade, histórico e protocolos locais.
- Se persistir LSIL por 2 anos ou houver piora, avançar para colposcopia.
Em pessoas mais jovens, a conduta é frequentemente mais conservadora, pois a regressão é muito comum. Em faixas etárias mais altas, prefere-se triagem com HPV e/ou colposcopia mais precoce.
Situações especiais
- Gravidez:
- ASC-US/LSIL na gestação raramente exige procedimentos invasivos imediatos.
- Pode-se realizar colposcopia para excluir lesão de alto grau se houver suspeita, mas a maioria dos casos leves é acompanhada e reavaliada no pós-parto.
- Não se realiza curetagem endocervical em gestantes.
- Imunossupressão (ex.: HIV, uso crônico de imunossupressores, transplante):
- Maior risco de persistência/progressão.
- Seguimento mais próximo e colposcopia precoce costumam ser indicados.
- Resultados repetidamente “insatisfatórios” para avaliação:
- Pode ser necessário repetir a coleta, tratar possíveis infecções, ajustar o preparo antes do exame ou usar colposcopia conforme a avaliação clínica.
Colposcopia e biópsia: quando entram em cena?
- Colposcopia é um exame no consultório que “olha de perto” o colo do útero com lentes de aumento e aplicação de soluções (ácido acético, lugol).
- Se a colposcopia sugerir área suspeita, a profissional pode realizar biópsia dirigida.
- A biópsia confirma se existe e qual é o grau da lesão (por exemplo, NIC 1, NIC 2, NIC 3).
- NIC 1 costuma corresponder a LSIL e muitas vezes é apenas observado com acompanhamento.
- NIC 2/3 (alto grau) geralmente pede tratamento para remover/ablar a área alterada.
Como se preparar para repetir o exame (e melhorar a qualidade da coleta)
- Evitar relações sexuais, duchas, cremes vaginais e óvulos por 48 horas antes da coleta.
- Evitar o período menstrual (se possível); o ideal é alguns dias após o fim do fluxo.
- Tratar corrimentos/infecções previamente, se presentes.
- Informe se usa contraceptivos hormonais, dispositivos intrauterinos ou se está grávida.
Dúvidas frequentes
- Quanto tempo leva para “sumir”?
- ASC-US e LSIL costumam regredir em meses a poucos anos, especialmente em pessoas até 30 anos. Persistência além de 1–2 anos pode levar sua médica a indicar investigação adicional.
- Preciso tratar HPV?
- O HPV não tem “remédio” específico. O foco é acompanhar as alterações que ele pode causar. Estilo de vida e imunidade influenciam a regressão.
- A vacina contra HPV ainda vale a pena?
- Sim, mesmo para quem já iniciou vida sexual. A vacinação reduz risco de novas infecções e de lesões futuras. Converse com sua médica sobre indicação na sua faixa etária.
- Posso ter relação sexual normalmente?
- Sim, salvo orientações específicas da sua médica. Preservativo ajuda a reduzir transmissão de ISTs e exposição a novos tipos de HPV.
Hábitos que ajudam na saúde do colo do útero
- Vacinação contra HPV conforme elegibilidade etária.
- Não fumar (o tabagismo está associado a maior persistência de lesões).
- Alimentação equilibrada, sono adequado, manejo do estresse e atividade física.
- Uso de preservativo, especialmente com novos/parceiros múltiplos.
Checklist prático para levar à consulta
- Meu laudo cita teste de HPV? Qual o resultado (e genótipo 16/18)?
- Houve nota sobre qualidade da amostra (ex.: “amostra satisfatória”/“insatisfatória”)?
- Qual o plano de seguimento sugerido (repetir em 6, 12 meses, colposcopia)?
- Tenho fatores de risco (tabagismo, imunossupressão, histórico prévio de lesões)?
- Estou grávida ou amamento?
- Quando devo retornar se surgirem sinais de alerta (sangramento após relação, sangramento fora do período menstrual, dor pélvica persistente)?
Informações finais
- ASC-US e LSIL são achados comuns e, na maioria das vezes, passageiros.
- O mais importante é não perder o seguimento: repetir os exames no intervalo recomendado e realizar colposcopia quando indicada.
- Com rastreio e acompanhamento adequados, o risco de evoluir para algo grave é muito baixo.

